quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Passeio pela BR 116

O termômetro da rua marcava 40° quando entramos em Governador Valadares no final da tarde de domingo. Nada mal para um dia que começou chuvoso e permaneceu nublado. A cidade estava completamente silenciosa e vazia, nem parecia a mesma na qual estivemos há 11 dias. Ao contrário, o carinho da família Resende continuava o mesmo. Isaura nos aguardava com uma fornada quentinha de pão de queijo mineiramente amassado e temperado, daquelas de comer rezando.
Desta vez conversamos menos porque nos deitamos cedo. Ainda que a estrada estivesse vazia e a viagem transcorrido da melhor forma, a alternância entre chuva e sol durante o dia nos cansou bastante. Na madrugada de segunda Isaura fez questão de levantar às 6h para preparar o café e se despedir. Prestativa que só fez questão de nos fotografar antes de partirmos rumo aos 450 quilômetros até Juiz de Fora, cidade de meus parentes maternos.
Optamos por seguir pela BR 116 para fugir da BR 381, a rodovia da morte. Passar por ali novamente só em caso de absoluta necessidade.
Foi a melhor escolha. Gastamos seis horas em uma estrada super tranquila, sem movimento, com paisagens lindíssimas e praticamente sem buracos. A única exceção foi em Muriaé, onde parte da pista foi levada pelas chuvas de janeiro e um desvio improvisado surge no meio da estrada.
Entre Caratinga e Carangola as montanhas estavam cobertas por cafezais, bonito de ver. Onde faltava café sobrava gado, geralmente pequenos rebanhos leiteiros. Tive certeza de que estava em Caratinga ao passar pela estátua do Menino Maluquinho, criação do escritor e cartunista Ziraldo, um dos ilustres filhos da terra.
No meio do percurso ultrapassamos um caminhão com placa de Medianeira, distante de Maringá cerca de 300 quilômetros. Qual não foi a nossa surpresa ao sermos abordados pelo motorista no posto em que paramos para abastecer em Manhuaçu. "Então vocês são de Maringá?", quis saber o jovem, de quem nem perguntamos o nome. Naquela segunda, 20, fazia 18 dias que ele estava na estrada. A primeira entrega da carga de frios que transportava foi feita em Belém do Pará, e a segunda seria no Rio de Janeiro, para onde ele seguia. Chegaríamos em casa no mesmo dia, quinta-feira. Nos despedimos ali no posto com votos mútuos de boa viagem e mais uma vez na estrada, poucos minutos adiante.
Este percurso era o menor até agora e estávamos alegres e felizes, contemplando a paisagem e aproveitando a estrada vazia. Chegamos em Juiz de Fora pouco antes das 13h30, o recorde até então. Nos hospedamos na casa da prima Eveline, que já nos esperava.O restante do dia seria de visita a alguns tios e primos, lavanderia e descanso, claro. 















Chuva, chuvisco, chuvarada

Domingão de carnaval e a gente voltando para casa. A despedida foi na praia do Sting, onde passamos a ensolarada tarde de sábado admirando a beleza da paisagem sentados em frente ao mar azul. Bem, não ficamos apenas sentados, claro. Como sempre, o mar estava irresistível e convidativo. 
Em seguida à pequena participação no bloco Ladeira Abaixo, para não ir embora sem provar o gostinho do carnaval baiano, à noite jantamos com Gisele, Maurício e Giovana. Depois de trabalhar o dia inteiro, Maurício assumiu a cozinha e preparou o famoso bobó de camarão que é sua especialidade. Foi uma noite de recordações alegres dos dias maravilhosos que haviam chegado ao fim. Graças ao carinho e atenção da Gisele, Carla, Maurício e toda turma, nos sentimos em casa e já estamos com saudades.
Acordamos às 5h30 no maior silêncio para não incomodar a Giovana e a Cláudia, irmã da Gi, que dormiam na sala. Pouco antes das 6h começou a chover. Gisele levantou para se despedir da gente e foi ótimo abraçá-la antes de pegar a estrada. Paramos para abastecer logo na saída de Arraial e aproveitamos para vestir a roupa de chuva, pois o céu não estava em um dia de muitos amigos. Seguimos devagar até o Vale Verde, pequena vila a 20 quilômetros do Arraial, esperando que as nuvens escuras se mantivessem distantes, mas era pedir demais. Aproveitamos para tomar café - o primeiro sem pão, apenas cuecas viradas sem açúcar - enquanto a chuva caía mansa.
E assim foi até a divisa com Minas Gerais. Em alguns trechos a chuva apertou, mas nada que preocupasse ou atrapalhase a viagem. O céu permaneceu carregado nos 630 quilômetros até Governador Valadares, cumpridos em oito horas.
O tempo esquentou quando entramos em Minas, embora as nuvens continuassem amontoadas e cinzas lá no céu. A estrada vazia permitiu contemplar com detalhes as altivas montanhas de pedra entre Nanuque e Teófilo Otoni. De encher os olhos.
Em meio a tanta chuva, um subversivo arco-íris rompeu a sisudez do céu e apareceu para nos desejar boa viagem quando estávamos de saída de Arraial. Na entrada de Valadares, o sol, que também se esforçava para desviar da barreira cerrada de nuvens, apareceu envolto em círculos coloridos, em uma espécie de boas-vindas. Sentimos que seria uma boa viagem de volta.


 







Mamãe eu quero, mamãe eu quero ficar..

Bahia que é Bahia tem carnaval e não poderíamos ir embora sem sambar um pouquinho. Na tarde de sábado pegamos carona com o bloco Ladeira Abaixo em um trechinho pela rua do Mucugê, porque alegria de menos é bobagem.


E não é que encontramos a Carla no meio da muvuca?



Rainha e princesas do Ladeira Abaixo



Depois de abrir o desfile do Ladeira Abaixo, as crianças voltam para a rua amparadas pelos pais foliões

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Riso largo, simpatia estampada no rosto

Giovana, a caçula da Gisele, completou 20 anos quinta-feira, 23, dia em que chegamos em casa. Mandamos daqui desejos de vida longa e plena de realizações para a Carra, super par da infalível, intrépida, adocicada e destemida dupla Tiramissú. Sucesso e muitas felicidades nos incríveis dias que vêm por aí.







Na frequência da emoção

Melhor relações públicas que Arraial d'Ajuda há de ter, Giulia, filha mais velha da Gisele e futura engenheira florestal domina todas as baladas e conhece como ninguém os ótimos lugares para curtir a essência da charmosa e animada vila. No restaurante do Paulinho Pescador, o estrogonofe de frango é a preferência nacional da loira, que recusa qualquer outra das delícias constantes do cardápio (o mesmo há 20 anos) e se entrega ao pecado da gula toda vez que está na cidade, já que estuda em Botucatu. Nesse dia fizemos companhia ao seu bom gosto, mas fomos de estrogonofe de camarão, muito bom também. Liga não pela foto estar desfocada, Giulia. A câmera também se emocionou. 





Clau, does a little magic

Cláudia, esse post é pra você. Taí o Sting baiano dando uma palhinha em "Every little thing she does is magic", em nossa última tarde na praia. Faça uma mágica e tente ver alguma semelhança entre o real e a cópia, rs. Só para te ajudar, ele é o de camiseta preta. Iôô, iôô, iôô...


Babel baiana

Nos últimos anos, além de espanhol, inglês e italiano, hebraico é uma das línguas mais ouvidas nas estreitas ruas de paralelepípedo do arraial. A Costa do Descobrimento foi "descoberta" pelos israelenses, especialmente os jovens, que veem o sul da Bahia como o destino certo para aproveitar os dois anos de folga concedido pelo serviço militar obrigatório. É tanta gente falando a língua do Cristo que, na baixa temporada, a vila é tratada pelos nativos como "Israel d'Ajuda". Vários estabelecimentos facilitam a vida dos clientes oferecendo cardápios em hebraico. Que sorte, não?

 

Um pouco de história


A igreja de Nossa Senhora d'Ajuda (1549/1551) é o marco de nascimento do Arraial d'Ajuda. A "Santa", como é chamada pelos moradores, deu o nome à vila, inicialmente Arraial de Nossa Senhora d'Ajuda. Contam as lendas que uma pequena imagem de N. Sra. d'Ajuda foi encontrada próxima ao local de construção da igreja e o primeiro milagre da "Santa" foi conceder a "aparição da água", uma fonte, tanto para uso doméstico como para o preparo da argamassa da construção da igreja. Essa fonte fica na falésia atrás da igreja e consta que "quem toma banho na Santa não vai mais embora"... (bem, nós não precisamos desse banho para desejar morar aqui para sempre). Parada no tempo desde o período do descobrimento, a Capitania de Porto Seguro teve um desenvolvimento muito lento. Já em 1501 os portugueses chegaram a Salvador e em 1532 Martim Afonso fundou São Vicente - vilas para onde se deslocaram os interesses dos colonizadores. Assim, Porto Seguro e Arraial d'Ajuda tiveram pequena importância econômica e somente a Vila Verde, atual Vale Verde, a 23 quilômetros do Arraial, produzia açúcar. Com o passar do tempo, os milagres e a fama da "Santa" se espalharam e fiéis de toda parte começaram a visitar o local. Nasceu assim a vocação do Arraial d'Ajuda para o turismo: há muito tempo os moradores já recebiam os visitantes, principalmente na época da novena e Nossa Senhora d'Ajuda, de 9 a 15 de agosto de cada ano. Na década de 1970 chegaram os "hippies", como eram chamados os primeiros turistas - jovens estudantes, alternativos, mochileiros - que no verão enchiam a pequena vila de cores e sons, acampando nas praças ou alugando as casas dos pescadores. A paz, a tranquilidade, a receptividade do Arraial d'Ajuda logo foram espalhando notícias e, além da vinda de cada vez mais visitantes, muitos deles foram ficando, comprando lotes, fazendo suas casas, quartos para alugar, pequenos restaurantes, lojinhas, arte e artesanato. A magia do Arraial d'Ajuda espalhou fama. Brasileiros e estrangeiros vieram, viram e ficaram, formando uma das comunidades mais cosmopolitas do nordeste brasileiro.

Igreja de Nossa Senhora d'Ajuda
Contornando a igreja, esta é a vista que se apresenta. As fitinhas são amarradas em louvor à santa milagreira, agradecendo ou pedindo alguma graça
Parque central e praia de Araçaípe

Yes, nós temos Broadway!
Quer dizer, Brodway



Esta é a rua do Mucugê, onde estão os restaurantes e lojas mais baladados


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Pérolas do caminho






Dia ótimo, noite deliciosa

Embora a Gisele insista que o melhor horário para visitar Trancoso seja o final da tarde, fomos para lá na quinta de manhã com a gorducha, incentivados pela Carla. Foi a primeira vez que a moto pegou a estrada desde que chegamos. Vencemos os 26 quilômetros que separam as duas cidades rapidinho. Administrativamente, Arraial d'Ajuda e Trancoso são distritos de Porto Seguro. Para quem chega a Trancoso pelo asfalto, e não pela estrada de terra, a paisagem urbana destoa completamente das imagens de cartão-postal. Com 28 mil habitantes, segundo nos disse o Roberto, fiscal da prefeitura que trabalha no Quadrado, Trancoso começa a mostrar as consequências do crescimento urbano desordenado. Lamentável. Ao chegar ao Quadrado, uma praça de terra "observada" pela Igreja de São João Batista, a conversa é outra. Pousadas, restaurantes, bares e lojas de grife muito charmosos compõem, colorem, decoram e alegram o cenário, que mais parece saído de um conto. As mesas são colocadas na grama e à noite a iluminação é à base de luz de velas, lindamente colocadas nas árvores. Ficamos devendo essa foto, pois voltamos antes do pôr do sol. Passamos a tarde na praia dos Coqueiros, a primeira com cara de verão. Muitos vendedores ambulantes e uma porção de frango à passarinho na barraca à beira-mar por R$ 45 lascas. Ui! Preferimos duas águas de coco, até porque havíamos combinado de jantar com a Gisele e o Maurício no restaurante São João, em Arraial. Uma moqueca de peixe com camarão nos aguardava. Aberto desde 1974 e no Guia 4 Rodas desde 1985, sabíamos que o esforço valeria a pena. E valeu muito.
 











 
 









Mundo pequeno


Desde que chegamos estamos ocupando a suíte 10 do Arraial d'Ajuda Hostel. Amanhã, sábado, saímos do albergue e dormimos na casa da Gi, pois na madrugada seguinte pegamos o caminho de volta para casa. O hostel está lotado para o Carnaval. Aliás, os hóspedes não param de chegar desde o início de janeiro, jovens de várias partes do mundo, especialmente argentinos, israelenses e europeus. Há brasileiros também, claro, mas o castelhano é a língua que domina os animados cafés matinais e os lanches da tarde. Os chicos y chicas estão por toda parte. É uma gente bonita, disposta, alegre e muito espirituosa, para combinar com a essência desse tipo de hospedagem. O Arraial d'Ajuda Hostel é filiado à Hostelling International (HI), a maior rede de hospedagem do planeta. Surgiu de uma filosofia de viagem que mistura a descoberta de culturas e pessoas com um turismo econômico e acessível a todas as idades. Em 26 de agosto de 1909, o professor alemão Richard Schirmann idealizou a criação dos hostels depois de ser surpreendido por uma tempestade, quando precisou refugiar-se ao longo de uma estrada. O primeiro hostel começou a funcionar em um castelo em Altena, na Alemanha, monumento histórico restaurado que existe até hoje. No final da década de 20 do século passado o alberguismo se difundiu por toda a Europa. Só em 1934 o movimento chegou ao continente americano, primeiramente nos Estados Unidos. A Argentina (1956) e o Uruguai (1958) foram os primeiros países sul-americanos a fazer parte do movimento. Ambos trabalharam pela expansão da rede na América e abriram as portas para o ingresso dos países latinos, chegando até o Brasil. Nós nos associamos à HI e daremos preferência ao hostel quando viajarmos.